Direito no Agronegócio

[Marina Pedigoni e Julia Siqueira] – “O contrato de parceria rural – Como evitar riscos trabalhistas”

MARINA PEDIGONI MAURO ARAÚJO
OAB/SP 325.912. Graduada e Mestre em Direito pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (UNESP). Especialista em Gestão de Pessoas pelo Instituto de Pesquisas e Educação Continuada em Economia e Gestão de Empresas, da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz – Universidade de São Paulo (PECEGE – USP/ESALQ).
Advogada no Pádua Faria Advogados.

JULIA MARIA SIQUEIRA
Graduanda em Direito pela Faculdade de Direito de Franca. Paralegal no Pádua Faria Advogados.

PÁDUA FARIA ADVOGADOS
Site: www.paduafariaadvogados.com.br

A utilização de terras pelos proprietários rurais pode ser vista, por alguns, como algo secular e tradicional, a partir de práticas que passam de geração por geração. Porém, a partir de uma visão de mercado do agronegócio, cada vez mais é a ampliada a visão empresarial das atividades agrícolas, a qual tem, dentre as suas frentes, a gestão dos riscos e dos passivos.

Os contratos de parceria rural estão inseridos nesta perspectiva de gestão, em principal quando o parceiro outorgado – aquele que recebe o imóvel para uso – é pessoa física. Isto porque, se a contratação não for realizada conforme a legislação específica, gera-se um risco de reconhecimento de vínculo empregatício em favor deste.

Nesse cenário, a parceria rural pode ser definida como o negócio jurídico estabelecido entre as partes, o qual por meio dela, uma das partes se obriga a ceder à outra, por tempo determinado, o uso específico de imóvel rural, ou de partes dele. A Lei nº 4.504/64 do Estatuto da Terra e o Decreto nº 59.566/66 dispõem sobre as regras para os diferentes contratos agrários.

Em um contrato de parceria rural é estipulado de forma bem definida, entre o parceiro outorgante e o parceiro outorgado, as regras acordadas relativas à partilha da produção e também aos riscos do negócio. Sendo assim, o parceiro outorgado, de forma independente, exerce sua atividade, sem a interferência do proprietário do imóvel rural.

Dessa forma, ocorre a divisão de papéis de forma bem definida, entre as partes, em que os parceiros, assumem os riscos da perda da atividade agrícola, bem como os resultados esperados.

Nessa divisão, estão previstos os riscos possíveis a serem enfrentados, como produtos, lucros, perda dos frutos, inclusive decorrentes de caso fortuito e força maior, ou devido a variação de preço no mercado. Outrossim, nessa divisão, podem ser incluídas as benfeitorias realizadas que tenham como finalidade facilitar ou melhorar a atividade pecuária, agroindustrial, de exploração agrícola, ceva, ou de extração de matérias-primas de origem animal.

Nesse contexto, as partes, conforme a lei, de comum acordo, estipulam no contrato, a quantidade do montante da participação de cada um, com estabelecimento do percentual pertencente ao parceiro outorgante e ao parceiro outorgado.

A priori, um contrato de parceria rural bem feito deve ser realizado de forma escrita, a fim de evitar possíveis discussões na justiça e para facilitar acordos a serem rea-lizados. Nada impede, de acordo com o Estatuto da Terra e o Decreto Regulamentador, que esses contratos sejam realizados de forma verbal, mas conforme explanado, não é o aconselhável a se fazer.

Ademais, o contrato de parceria deve perpetuar no prazo mínimo de 3 anos, a fim de garantir ao parceiro a conclusão da colheita acordada. Expirado esse prazo, o proprietário pode explorar a atividade rural por conta própria e caso assim não queira, o parceiro outorgado terá a preferência em firmar um novo contrato. Dessa forma, é necessário que os acordos sejam realizados 6 meses antes do término do contrato.

Nesse viés, é necessário haver nos contratos de parceria rural, informações previamente estipuladas, como os possíveis riscos do negócio; especificação da atividade a ser exercida no tipo de contrato firmado; descrição detalhada do imóvel; prazo de duração do contrato; fixação dos percentuais de colheita, da cota parte, forma de partilha, investimento e recursos inerentes a cada um dos parceiros e a descrição de benfeitorias.

Ante ao exposto, todos os riscos, como a possibilidade de perda do negócio, devido a pragas, casos fortuitos ou de força maior, é partilhado de antemão entre as partes, de forma que os contratantes arcarão com os riscos do empreendimento.

O vínculo empregatício, por sua vez, é formado pelo empregador, o qual assume os riscos da atividade econômica, arcando com todos os seus custos e direcionando a prestação de serviços; e pelo empregado, o qual trabalha, com habitualidade em troca do seu salário, obedecendo as ordens do empregador.

Portanto, as principais diferenças entre a parceria agrícola e o vínculo empregatício referem-se à divisão de riscos do negócio entre as partes na parceria, e o cumprimento de ordens na relação trabalhista. É preciso se atentar, assim, para que a parceria agrícola, documentada em um contrato, ocorra, na prática, exatamente como combinada. Isto porque o direito e a Justiça do trabalho, pela chamada “primazia da realidade”, consideram ser válido o que realmente ocorria entre as partes, e não necessariamente o que foi contratado.

Como exemplos de condutas que fraudam a parceria agrícola, podemos citar a obrigatoriedade de cumprimento de jornada, o pagamento de salário mensal e a realização de descontos de valores, enquanto que, na parceria rural, ocorre a partilha dos riscos e dos resultados do negócio, geralmente apenas ao final. Não é comum que ocorram adiantamentos de valores ou trabalho em tarefas distintas do objeto do contrato de parceria, o que pode configurar o vínculo de emprego.

O verdadeiro parceiro outorgado atua de forma independente, sem controle ou interferência do proprietário do imóvel rural quanto à forma de cultivo ou tratamento de animais. É possível que desempenhe as atividades por meio de outros trabalhadores, sem qualquer tipo de penalidade contratual.

Assim, nota-se que a utilização da terra, a partir da negociação com terceiros para sua exploração, tem seu grau de assertividade ampliado a partir de um olhar jurídico sobre os contratos firmados, garantindo-se a redução de riscos pela observância das normas jurídicas e trazendo um maior grau de transparência, pela documentação dos detalhes da parceria firmada.

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