Cafés Especiais

Cafés da Região de Garça (SP): Valorizando a história para construir o futuro

ENGº AGRº PAULO HENRIQUE LEME
Coordenador de Incubadora e Parque Tecnológico na empresa Inbatec/UFLA
Professor na UFLA – Universidade Federal de Lavras

Sexta-feira, dia 18 de outubro, oito e meia da noite, caia uma abençoada chuva na Região de Garça. Enquanto o café agradecia pelas águas, cafeicultores, familiares e Garcenses acompanhavam com emoção o desenrolar de uma história. Era sua história.

Na tela do Teatro Municipal de Garça, ao redor de 300 convidados assistiam ao filme que mostrava a identidade, a história e as riquezas dos cafés da Região de Garça(1). Ao final da apresentação, era possível ver muitos olhos marejados. Mais do que isso, eram pessoas com a cabeça erguida, com orgulho de sua história. Com esperança no futuro e força para construir novos caminhos.

A cafeicultura na Região de Garça foi a última a ser desbravada no Estado de São Paulo. Até meados do século XIX, as áreas mais ao oeste eram chamadas de “sertões desconhecidos”. Foi no início do século XX que as primeiras fazendas de café foram formadas na cidade de Gália. Rapidamente o café se expandiu na região. Em 1920, os trilhos da Cia Paulista chegaram até a região, levando prosperidade econômica e muitos imigrantes, japoneses, espanhóis, italianos, etc. Moldaram o futuro.

Detalhe da província de São Paulo em 1868.
Igreja da Companhia Inglesa — Gália, SP (2019). (Créditos: Catenacom)

Esta é uma história de pioneiros.

As gerações de cafeicultores que formaram a região foram sucedidas por empreendedores que fundaram cooperativas de café referência no país. Dentre elas, a Coopemar em 1961 (Marília/SP) e uma das maiores cooperativas de café do Brasil, a Garcafé em 1962 (Garça/SP). No ano seguinte, a Garcafé faria sua primeira exportação de café. Em 1964, a Garcafé, com Jaime Nogueira Miranda à frente, liderou um importante projeto de renovação da cafeicultura brasileira.

O pesquisador Dr. Alcides Carvalho (IAC)

A Região de Garça teve papel fundamental na cafeicultura brasileira. Nos solos da região, experimentos importantes foram realizados pelo IAC de Campinas, pelo saudoso Dr. Alcides Carvalho. Tecnologias, como o plantio de mudas de café em tubetes (2) e a primeira colhedora de café do mundo (3) também foram desenvolvidas por empreendedores de lá. Além disso, muitos cafeicultores da região se estabeleceram no Cerrado Mineiro e no Sul de Minas Gerais após a grande geada de 1975, contribuindo para a expansão do café no Brasil.

A história se confunde com as belas paisagens. Ao chegar à Região de Garça, destaca-se o lindo relevo ondulado. São diversas nascentes de água, rios menores que ajudam a formar as bacias hidrográficas do Rio Peixe e Rio Aguapeí. Inúmeras cachoeiras favorecem o turismo de aventura e rural, com hotéis fazenda e hípicas. Os solos são férteis e o terreno favorece a mecanização. Com altitude média acima dos 650m e latitude central de 22°10’S, o clima é adequado para o cultivo do saboroso café arábica. No alto dos espigões, com a vista maravilhosa do Planalto de Marília, a cafeicultura se desenvolve.

Nos 14 municípios da Região de Garça, mais de 1500 famílias se envolvem diretamente com a produção de café. O perfil é de pequenos e médios cafeicultores em sua maioria, com algumas grandes propriedades que se destacam pelo intensivo uso de tecnologia. A produção varia de 600 mil a 1 milhão de sacas de acordo com a bienalidade do café. A maioria dos cafés é processada através da seca natural, com destaque para o crescimento do cereja descascado nos lotes de cafés especiais (4).

Região de Garça (2019) (Créditos: Catenacom)
Florada na Região de Garça (2019) (Créditos: Catenacom)
Cachoeira Sítio Cantu (2019) (Créditos: Catenacom)

Entre as variedades cultivadas na Região de Garça estão o Icatu Amarelo, Ouro Verde, Obatã, Mundo Novo e outras novas variedades de destaque nacional no processo de renovação das lavouras.

Durante a realização do estudo sobre as características da xícara da Região de Garça, provadores e pesquisadores ajudaram a caracterizar a bebida. A bebida apresenta um café encorpado e adocicado, com média acidez e equilíbrio na xícara. As notas de destaque são o chocolate amargo, avelã, amêndoas e castanhas torradas, por vezes floral e frutado (especialmente nos microlotes), com leve acidez cítrica, finalização complexa e retrogosto persistente. Os cafés apresentam equilíbrio muito bom entre doçura, intensidade e corpo acentuado. A acidez se pronuncia em torras mais claras. Os blends para espresso são espetaculares.

Colheita de Café na Região de Garça (2019) (Créditos: Catenacom)
Produtor Paulo Granchelli (Créditos: Catenacom)
Produtor Cassiano Tosta (Créditos: Catenacom)

Pioneirismo da produção de cafés com personalidade.

Um nova geração começa a desenhar novos caminhos para a Região de Garça. São os cafés com personalidade, uma marca registrada da região. De olho no mercado de cafés especiais e no comércio direto, muitos produtores vem investindo na torra dos próprios cafés, com origem garantida da fazenda à xícara. São microlotes dos melhores cafés, que chegam a cafeterias e confeitarias, e que agradam ao paladar dos consumidores em grandes cidades de São Paulo e na capital.

Para conduzir este processo surge uma nova entidade, o Conselho do Café da Região de Garça, que tem como missão regular e proteger o uso da marca “Região de Garça” (5). A grande meta é conseguir a Indicação de Procedência reconhecida pelo INPI.

Durante o lançamento da marca da Região de Garça, conforme os cafeicultores que participaram do 2°Concurso de Qualidade dos Cafés da Região de Garça eram chamados ao palco, era possível sentir com eles a emoção de saberem que, a partir daquele momento, muita coisa iria mudar na vida dos produtores e da Região.

O projeto de valorização e resgate histórico dos cafés da Região de Garça tem sido tão importante para a região que já foi reconhecido com o Prêmio Sebrae Prefeito Empreendedor — Mário Covas, etapa paulista do prêmio oferecido pelo Sebrae (6).

Marca dos Cafés da Região de Garça

Reunião do ConGarça (2018)

Reconstruir a identidade de uma Região.

Ouvir os cafeicultores. Sensibilizar o poder público e as empresas. Envolver pessoas. Quando alguém vê a marca de uma Região, não imagina as histórias, emoções e trabalho que envolvem um projeto como esse.

Os Cafés da Região de Garça começam a construir uma nova página em sua linda história.

Vídeo Institucional — Cafés da Região de Garça.

REFERÊNCIAS

1 — Vídeo Institucional — Cafés da Região de Garça (https://www.youtube.com/watch?v=kflPBqBs3VU&t=188s).

2 — Café em Tubetes, A Origem (https://www.adealq.org.br/revista/materia/cafe-em-tubetes-a-origem-1006).

3 — O legado de Shunji Nishimura (http://www.nippo.com.br/campo/historia/index.php).

4 — www.regiaodegarca.org

5 — Vídeo de apresentação da marca dos Cafés da Região de Garça (https://www.youtube.com/watch?v=L9lTb18EG1E).

6 — Garça vence a etapa estadual do Prêmio Sebrae Prefeito Empreendedor (https://www.garca.sp.gov.br/noticia/2751/garca-vence-a-etapa-estadual-do-premio-sebrae-prefeito-empreendedor/).

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