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[Davi Moscardini] – Remineralizadores de solo: Pós de rocha são realmente eficientes para o fornecimento de nutrientes às plantas?

DAVI MOSCARDINI
Engenheiro Agrônomo, Mestre em Fitotecnia – ESALQ/USP
E-mail: davi.moscardini@usp.br

Algumas tendências passageiras parecem surgir de tempos em tempos no mundo da moda. Surpreendentemente o mesmo tem acontecido na agricultura brasileira. O resgate do ultrapassado pode ser muito lucrativo para a indústria têxtil, mas não parece ser uma ideia brilhante para a nutrição de plantas.

A prática denominada rochagem consiste basicamente na aplicação de rochas naturais finamente moídas (pós de rocha) diretamente no solo, sem qualquer tipo de tratamento térmico ou químico prévio. No Brasil diversas destas rochas são comercializadas com o propósito de fornecer nutrientes de forma gradual ainda que sua eficiência agronômica seja no mínimo questionável.

As rochas consideradas remineralizadores de solo são constituídas de minerais que realmente contêm nutrientes de plantas como a apatita (fósforo), fonolito e siltito glauconítico (potássio) e o dunito (magnésio). O ponto chave desta questão é que estes nutrientes estão ligados de forma extremamente estável à estrutura cristalina do mineral que constitui a rocha. Em outras palavras significa dizer que estes nutrientes não estão prontamente disponíveis às plantas devido a sua insolubilidade em condições normais de cultivo.

Às formas convencionais de se produzir fertilizantes fosfatados nos dão uma ideia da dificuldade de obtenção do fósforo presente na apatita, principal rocha utilizada para produção de fosfatados no Brasil. Esta rocha é extraída das minas e passa por um processo de moagem fina, seguida de desmagnetização e flotação para produção do concentrado apatítico. Posteriormente esta solução tem que ser atacada um ácido forte para finalmente produzir Super Simples (Ácido sulfúrico), Super Triplo (Ácido fosfórico) ou Nitrofosfatos (Ácido nítrico). Todos estes fertilizantes são solúveis em água ou CNA + Água, extratores eficientes para atestar disponibilidade de fósforo (P) às plantas. Outra forma de obter P é através da solubilização térmica. O concentrado apatítico tem que ser aquecido a 1500 °C, resfriado de forma brusca e posteriormente ser moído finamente para que seja produzido o termofosfato magnesiano solúvel em ácido cítrico 2%.

Fica a minha pergunta aos entusiastas do pó de rocha: Que tipo de solo, microrganismo ou compostagem são capazes de atingir o poder químico e/ou térmico necessários para a produção de fertilizante fosfatados a base de apatita? Não é raro encontrar lavouras de café com severa deficiência de fósforo (P) na Alta Mogiana, principalmente no inverno onde às baixas temperaturas e o déficit hídrico prejudicam a absorção de P pela planta. Uma breve investigação basta para constatar que em muitos destes locais o preparo do sulco para plantio foi realizado somente com fosfatos naturais não reativos incorporados a compostos orgânicos e organominerais.   

Outro caso típico em regiões produtoras de café é o posicionamento de siltito glauconítico como fonte de potássio (K) para a cultura. Esta é uma rocha contém 10% de K2O total, mas apenas 0,2 % é solúvel e, portanto, disponível para as plantas. Para que o potássio desta rocha seja liberado seria necessário realizar um processo térmico de calcinação o que inviabilizaria economicamente sua comercialização. Vale ressaltar que o potássio é um dos nutrientes mais requeridos pelo cafeeiro. A substituição de fontes solúveis em água como o cloreto, sulfato ou nitrato de potássio por silicatos de baixa solubilidade como a glauconita é extremamente arriscado e pode acarretar em problemas como má granação e seca de ponteiros a depender do grau de deficiência de potássio.

Como atestar que os nutrientes do fertilizante que estou comprando estão disponíveis  para as plantas?

No momento da compra de qualquer fertilizante sólido exija as garantias (%) em extratores que realmente comprovem sua eficiência agronômica. Na prática os fertilizantes fosfatados devem ser solúveis em água, CNA + água ou ácido cítrico 2%. Já os fertilizantes potássicos devem ser solúveis em água ou ácido cítrico 2%.

Lembre-se de que a solubilidade total de fertilizantes sólidos não significa nada do ponto de vista agronômico, pois extratores utilizados para determinar P total e K total não refletem as condições de campo. Infelizmente, a Instrução Normativa nº 5 de 10 de Março de 2016, permite que na embalagem de remineralizadores possa ser informado o teor total de nutrientes como P e K, o que induz os agricultores e extensionistas ao erro.

Com a palavra, os colegas da EMBRAPA: “… em virtude das particularidades que ocorrem em estudos com fontes naturais e multinutrientes e de sua interação com os complexos sistemas produtivos atualmente no Brasil, as informações obtidas até o momento não são conclusivas a respeito da eficiência agronômica destas fontes na escala de tempo dos cultivos agrícolas e em quantidades suficientes para sua recomendação de uso. Outra dificuldade é que os esforços nos estudos não relacionaram estas fontes com as regiões de consumo, o que é imprescindível em se tratando de fontes de baixa concentração de nutrientes, cuja viabilidade econômica depende fortemente de questões logísticas, basicamente transporte. Assim, o posicionamento oficial da Embrapa sobre esse tema é que, atualmente, não há informação científica suficiente para se recomendar agrominerais silicáticos como fonte de nutrientes, sobretudo, de potássio, ou condicionadores de solos para a agricultura.”

Literatura recomendada

Embrapa. Esclarecimentos sobre uso de agrominerais silicáticos (remineralizadores) na agricultura – Official statements. Acesso em: < https://www.embrapa.br/en/esclarecimentos-oficiais/-/asset_publisher/TMQZKu1jxu5K/content/esclarecimentos-sobre-uso-de-agrominerais-silicaticos-remineralizadores-na-agricultura?inheritRedirect=false>.
MAPA. Instrução Normativa nº 5 de 10 de Março de 2016. Acesso em: < https://www.gov.br/agricultura/pt-br/assuntos/insumos-agropecuarios/insumos-agricolas/fertilizantes/legislacao/in-5-de-10-3-16-remineralizadores-e-substratos-para-plantas.pdf>.

MAPA. Instrução Normativa nº 39 de 8 de Agosto de 2018. Acesso em: < https://www.in.gov.br/materia/-/asset_publisher/Kujrw0TZC2Mb/content/id/36278414/do1-2018-08-10-instrucao-normativa-n-39-de-8-de-agosto-de-2018-36278366>.

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