MARA LUIZA GONÇALVES FREITAS
Especialista em Cafeicultura Empresarial
Em 2005, o Brasil, pela primeira vez, consolidou uma oportunidade real de fortalecer a sua plataforma exportadora de cafés especiais industrializados, mas ao invés disso, começou a importar monodoses de café brasileiro processado na Europa, sob a alegação de que era dessa forma de que o agricultor brasileiro era devidamente valorizado. Já éramos um dos principais mercados da IllyCafé e nos tornamos um dos importantes destinos de Nespresso. A indústria brasileira, com muito esforço, se adequou às tecnologias e hoje é possível consumir origens globais em nosso país, made in Brazil.
Ninguém esperava o efeito Donald Trump ferrando com o setor exportador de café verde em 50%, impedindo por completo o ingresso no mercado dos Estados Unidos, que ao firmar acordo internacional com a União Europeia, simplesmente acenou de onde irá comprar as suas matérias-primas. Afinal, a Alemanha é a sede de empresas como a Newmann Kaffee Group, um dos maiores importadores de cafés do mundo e o país, é o maior exportador de cafés do planeta, sem “ter um pé de café lá plantado” (desculpem a licença poética, mas essa afirmação é uma senhorinha).
E a culpa é de quem? Os cidadãos que fazem a política cafeeira recentemente num negócio da China, fecharam um grande acordo de exportação de cafés verdes para os chineses, chancelando para onde o café brasileiro deve caminhar, em meio a polarização internacional que está sendo liderada pelo governo norte-americano. O acordo simplesmente fez o café disparar no mercado interno, obrigando o brasileiro ferrado a pagar até R$ 95,00 pelo quilo do café tradicional, que não é aquela Brastemp, mas dá para o gasto.
Talvez seja o momento de o Brasil aproveitar a tragédia, se reinventar e começar a se posicionar mundialmente como plataforma exportadora de cafés em todos os segmentos: verde, industrializado em pó, em grãos, em cápsulas, solúvel, porque os Estados Unidos continuaram a consumir o nosso café, via aquisições de fornecedores europeus, que têm tarifas de 15%. Acredito que seja também o momento de investir em cafeterias. Em 2007 eu havia escrito um projeto nessa linha para o Governo do Estado de Minas Gerais, realizando um benchmarking da Federação Nacional de Cafeicultores da Colômbia – Juan Valdez – e me disseram que eu era maluca, porque eu não era produtora rural. A maluca aqui simplesmente continua a afirmar, que quem não domina o canal de distribuição, na ponta consumidora, fica refém de mercado.
A prova está aí. 50% de tarifaço no colo no principal mercado consumidor, que dita até o padrão de aquisição do café que é consumido dentro Governo do Estado de Minas Gerais – lançando mão do padrão SCAA – que é nada mais, nada menos, o Estado Brasileiro que é o maior produtor isolado de cafés do mundo.
Tragédias tarifárias, são também decisões políticas historicamente construídas. No caso do setor de café, basta analisar todas as decisões do CDPC ao longo de mais de 4 décadas.
1. Freitas MLG. O que o kaffee de lá tem que o café daqui não tem: um estudo comparativo entre os sistemas agroindustriais do café alemão e brasileiro. RAM, Rev Adm Mackenzie [Internet]. 2008;9(5):59–81. Available from: https://doi.org/10.1590/S1678-69712008000500004).