Café

[Silas Brasileiro] – “Desafios para os cafés do Brasil permanecem”

SILAS BRASILEIRO
Presidente do Conselho Nacional do Café (CNC)

No ano de 2019, estivemos no Quênia durante a 124ª Sessão do Conselho Internacional do Café, realizado pela Organização Internacional do Café (OIC), e pudemos observar um investimento chinês de altíssimo valor na construção de linhas férreas, inclusive sobrepondo áreas de safári para não impactar a vida animal. Na ocasião, avaliamos que não seria por acaso uma construção de custo tão elevado em uma região sem produção agrícola expressiva.

Posteriormente, em 2023, foi possível observar o crescente interesse do mercado europeu na última reunião presencial da Organização Internacional do Café (OIC), realizada presencialmente em Londres, onde houve contatos paralelos com representantes da Europa – inclusive com a presença do G7. Por meio do Diretor Geral de Cooperação para o Desenvolvimento do MRE da Itália e presidente do G7, Embaixador Stefano Gatti, foi proposta a liberação de recursos vultosos de um fundo global em construção, com cerca de 500 milhões de euros destinados a investimentos no continente africano, além de parte dos recursos voltados à América Central, Caribe e Colômbia.

Paralelamente, acompanhados do Embaixador José Augusto Silveira de Andrade da Rebraslon, nos reunimos separadamente – em três oportunidades – com os presidentes do G7, Stefano Gatti, e da illycaffè, Andrea Illy, junto de seu assessor, o diretor comercial da empresa Alessandro Bucci, com a presença de Marcos Matos, diretor geral do Cecafé, quando colocamos a posição firme do Brasil – um país que produz dentre do princípio da sustentabilidade, obedecendo todo o regramento ambiental e social, e que poderia receber investimentos para a renovação do parque cafeeiro no país cujo repasse feito para o produtor (FOB) está na ordem de 85% a 90%, e atenderia o abastecimento do mercado consumidor com maior volume em razão do aumento de produtividade.

Recentemente, recebemos uma consideração de que se oferecêssemos acesso aos nossos Bancos Ativos de Germoplasma (Bags) poderíamos ser também contemplados com os recursos do G7, o que consideramos inaceitável e abominável.

Ao longo dos últimos três ou quatro anos, temos presenciado, de forma insistente por parte dos países importadores, uma permanente busca por diversidade de origem. Em nossa avaliação, “isso nada mais representa do que o aumento da oferta de café para o mercado importador, sem um programa abrangente para o aumento do consumo”. A consequência direta é o desequilíbrio entre oferta e demanda, resultando em preços aviltados pagos aos produtores.

Também temos acompanhado a constante insistência para que o Brasil, por meio de cooperações entre governos ou através do Protocolo de Nagoya, se veja obrigado a fornecer nossos bancos de germoplasma e nossos resultados de pesquisa no setor cafeeiro. O compartilhamento irrestrito desse patrimônio genético e do conhecimento acumulado – fruto de altos investimentos públicos e privados – comprometeria nossa vantagem competitiva e estratégica.

Nossa legislação ambiental e social, extremamente severa e bem estruturada, impõe aos produtores brasileiros um custo elevado de produção. Seria injusto transferir gratuitamente esse know-how a países cuja legislação é muito mais branda ou mesmo inexistente, sem qualquer garantia de reciprocidade ou de proteção à propriedade intelectual.

Enquanto o Brasil segue com uma das legislações ambientais e sociais mais rigorosas do mundo, também se beneficia – legitimamente – de sua capacidade produtiva, sustentada pela ciência, pesquisa e conhecimento. Contamos com instituições como a Embrapa, o Consórcio de Pesquisa Embrapa Café, empresas estaduais de pesquisa, fundações, bancos ativos de germoplasma e, acima de tudo, com homens e mulheres – “cientistas e pesquisadores” – comprometidos com o avanço do conhecimento.

Cultivamos variedades mais precoces, mais produtivas, mais resistentes a pragas, doenças, altas temperaturas, secas prolongadas e frio intenso. O conhecimento acumulado em nosso país nos permite superar os maiores desafios da produção. O conhecimento é o que mantém nossa vantagem competitiva, sendo esse o nosso diferencial na vanguarda da produção de café no mundo.

Podemos afirmar que não temos vantagens comerciais como outros países produtores – como é o caso do anúncio da China de zerar a cobrança tarifária para importação de café de países africanos –, porém, o Brasil continua imbatível.

A grande pergunta que se impõe é: o que devemos fazer? Cabe às lideranças do sistema produtivo buscar, junto ao governo, avanços na legislação social, que deve ter como meta o caráter educativo, evitando, na medida do possível, abordagens meramente punitivas que comprometem a imagem da produção cafeeira nacional.

No aspecto ambiental, o Brasil preserva mais do que a legislação exige. “O cultivo do café não promove desmatamento”, e o aproveitamento de 40 milhões de hectares de áreas degradadas anunciadas pelo Governo, proporcionaria a expansão da cultura de forma sustentável, o que deve ser também um projeto governamental. Atualmente, o país cultiva café em 2.252 milhões de hectares, distribuídos por 17 estados produtores em 1983 municípios – onde o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) é mais elevado – abrangendo seis biomas, 330 mil cafeicultores, dos quais 254 mil são pequenos produtores (78%).

O Brasil conta ainda com programas como o Café Produtor de Água, que promove a conservação hídrica e recuperação de matas ciliares, valorizando os serviços ambientais prestados pelos cafeicultores brasileiros, inclusive com pagamento por serviços ambientais aos produtores.

Essa é a realidade brasileira.

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